sexta-feira, 7 de agosto de 2009



OS INIMIGOS DO POVO ESTÃO NO PODER

Eu tenho andado assustado com a atual crise no Congresso Nacional(atos secretos no Senado e farra das passagens na Câmara)! Não que eufosse ingênuo a ponto de achar que todos os políticos fossem honestosou mesmo que eu tivesse alguma esperança que 10% deles deixassem decorrer em caso de alguém gritar: "Pega ladrão"! O que tem me tirado osono (literalmente alguns dias!) é o fato de que a população toda estáaceitando a situação com a maior naturalidade do mundo...

Eu sou um eterno otimista quando se trata da situação brasileira,principalmente no que diz respeito ao progressivo amadurecimento danossa neófita democracia. Eu tinha certeza de que nós, "oscaras-pintadas", seríamos uma resistência consistente, oferecendoalternativas éticas que fossem viáveis para o fortalecimento e aperenidade das instituições. Eu vi o impeachment do Collor aos 14anos, com o orgulho de quem tinha ao seu lado uma nação, um povo quedava um sinal de “basta de desmandos”!

Diante das massivas denúncias de corrupção que vêm nos atropelandodurante os últimos anos (com pequenos intervalos de poucos meses,suficientes apenas para que tomemos fôlego!), entretanto, não possoevitar que tal convicção seja estremecida por uma dúvida cada vez maisconsistente. Os mesmos canalhas que assustavam o Brasil durante aDitadura Militar continuam no poder, com uma importância tão grandeque não sei dizer se a democracia efetivamente já chegou. Para piorara situação, hoje eles têm a seu lado as “crias” da prometidademocracia, que se deturpou em uma demagogia cada vez maisassustadora!

Parece que estamos todos esperando que as coisas se resolvam por simesmas, como aquele tipo de pai ou mãe que simplesmente desiste dofilho e deixa ele chorar até se cansar... Sendo que, enquanto isso,ele incomoda todos ao redor. Claro que esse "algo" que esperamos é amídia! Foi ela quem promoveu o movimento do "Fora Collor" e é ela quemtem decidido qual a importância que as denúncias têm desde então. Foiela também quem transformou um “escândalo menor” em motivo de renúnciade mandato de Renan Calheiros... Ora, vejam só: exatamente este formacom Collor a dupla alagoana que hoje representa a comissão de frenteque defende o Senador José Sarney, tudo com o aval explícito doPresidente Lula, que, tendo o Princípio da Separação de Poderes paralegitimar a sua pertinente indiferença, preferiu sair em defesadaquele que meses atrás para ele e seu partido era apenas mais uminimigo político na luta pela Presidência do Senado Federal.

Entretanto, não estou culpando a mídia... A mídia é feita pelos homense seus interesses, sejam estes individuais ou coorporativos. A culpa éda sociedade como um todo: ONG´s; todas as classes sociais;(pseudo)intelectuais; escritores; empresários; esportistas; artistas;estudantes; acadêmicos etc. Alguns músicos (Caetano Veloso, ChicoBuarque e companhia) são considerados como baluartes da luta contra oRegime Militar e agora, quando não existe censura, quando não existeopressão, quando a corrupção é a olhos vistos, eles se calam! Nãoposso evitar pensar que se movem pelo lema: "Desde que me permitamfalar, eu não me incomodo de ficar calado"!

Os escritores não são melhores! A Academia Brasileira de Letras, ondesupostamente deveriam estar concentrados os grandes intelectuaisbrasileiros, se esconde, não apenas porque faz questão de ser omissano processo democrático, mas porque o principal acusado da atual crise(José Sarney) é um de seus membros, ocupante da cadeira de número 38,que já foi assento de um dos grandes orgulhos nacionais: SantosDumont!

Também quero deixar claro que este não é um panfletopolítico-partidário contra o PMDB ou contra o senhor José Sarney, massim contra toda a crise ética que se instalou no Congresso Nacional!Os primeiros atos secretos datam de 1995; a suposta compra de votos dareeleição foi para a eleição de 1998... Quantos escândalos nãoassistimos calados neste intervalo de 11 anos? Cito apenas o (atéagora impune) Mensalão, para explicar o meu ponto de vista. A crisenão chegou a agora, ela é atemporal e apartidária, envolvendo todo oprocesso de escolha dos nossos representantes e os parâmetros deexercício de seus mandatos parlamentares. Toda essa baderna instaladaé apenas a gota d’água!

Quer dizer que algum desses políticos realmente quer que acreditemosque ele não via nenhum mal em nomear parentes; pagar assessores quemoravam no exterior; adulterar o painel eletrônico do Senado; vender asua cota de passagens aéreas; morar em imóvel funcional tendoresidência em Brasília; pagar passagens aéreas para a namorada ou paraum time de futebol? Será que somos tão burros que elegemos comorepresentantes um grupo de sujeitos que têm um conceito moral tãodiferente daquele reconhecido pelo senso comum? Será que eles têm amesma visão ética quando vão educar os seus filhos e netos? Não creioque as respostas a estas perguntas sejam positivas!

Mas este é apenas um desabafo... Eu gostaria de ver a população denovo nas ruas, demonstrando (sem violência de nenhum lado!) que sabe oque está se passando, que não aceitará calada tal descaração, quemarcará os responsáveis e que estes nunca mais ocuparão um cargoeletivo. Com certeza este é um sonho: viver num país de memória, ondeo povo compreende que os políticos é que deveriam estar submissos aopovo e não o contrário... Um país no qual os eleitos teriam noção dagrande responsabilidade que decorre do cargo que ocupam e docompromisso com o desempenho de sua nobre função.

Diante de tudo, porém, a minha sensação de impotência é total! Por viado amigo Rodrigo Sales, me vêm à cabeça as palavras de outro grandeorgulho nacional, Rui Barbosa ao dizer que “de tanto ver triunfar asnulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer ainjustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, ohomem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonhade ser honesto”.

Eu não sou um filósofo conhecido, um grande escritor, alguém ligado àmídia ou uma celebridade, que poderia, quem sabe, mobilizar as massas!Eu nem sei o que cada um desses setores citados poderia fazer, mas eume sentiria bem melhor se soubesse que eles estavam tentando fazeralgo... Hoje eu vou dormir tranqüilo por ter começado a fazer a minhapequena parte... Pois, como diria Madre Teresa de Calcutá: "Eu sei quesou uma gota no oceano, mas, sem esta gota, o oceano seria menor"!

Deixo, por fim, um poema escrito em 1964 (coincidência ou não, no anodo Golpe Militar!) pelo fluminense Eduardo Alves da Costa, embora sejafreqüente e erroneamente atribuído a Maiakovski:

Na primeira noite eles se aproximam,Roubam uma flor do nosso jardim e não dizemos nada;Na segunda noite, já não se escondem:Pisam as flores, matam o cão e não dizemos nada;Até que um dia, o mais frágil deles,Entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz eConhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da gargantaE já não podemos mais dizer nada!

É um bom momento de sabermos em que passo estamos da submissão...Terão os corruptos e imorais já arrancado a voz de nossa garganta? Ouainda é tempo de proferirmos nosso grito de insurreição? Com aresposta, cada um de nós!

Carlos Marden Cabral CoutinhoProcurador Federal, Especialista e Mestre em Direito e, hoje, mais umbrasileiro ajoelhado aos pés dos ocupantes do Poder.